Aos 20 anos, Neymar era o porta-voz de uma Seleção que acabava de fracassar, em Wembley, na decisão do ouro nos Jogos Olímpicos de Londres-2012. O menino agiu como homem. Não se escondeu. Descreveu o vestiário comandado por Mano Menezes após a derrota por 2 x 1 para o México. Assumiu erros. Foi até escudeiro de companheiros jovens como ele. Seis anos mais tarde, retrocedeu. Foi além do que havia feito logo depois de ser banido da Copa América de 2015. Como se não bastasse um texto na rede social após a eliminação contra a Bélgica na Rússia, repetiu uma ação publicitária de 2011 na noite de domingo, num mea-culpa em horário nobre. Só mudou o parceiro. Em vez da Nextel, a Gillette, que teria pago um cachê de mais de R$ 1 milhão.
Neymar veste a camisa principal da Seleção há oito anos. O comportamento do jogador na alegria ou na tristeza revela uma crise de identidade. Em Londres-2012, foi uma espécie de voz do Brasil. Blindou parças. O lateral-direito Rafael havia falhado no lance do primeiro gol. Oscar desperdiçou gol feito. “Todo mundo erra, eu errei um gol, o Oscar, também, é normal, a culpa não é deles”, defendeu.
Na Copa de 2014, dias depois do 7 x 1, Neymar convocou entrevista coletiva para falar da joelhada de Zúñiga. No ano seguinte, começou a inovar. Banido da Copa América depois de dar uma cabeçada no zagueiro Murillo e de puxar a manga da camisa do árbitro Enrique Osses, usou as redes sociais para pedir desculpa. “Peço perdão aos meus companheiros, mas saio com mais um aprendizado em minha carreira”, escreveu no Instagram.
Neymar surpreendeu até mesmo na conquista da inédita medalha de ouro nos Jogos do Rio-2016. “Não quero mais ser capitão da Seleção. É uma mensagem até para o nosso novo treinador, o Tite”, disparou.
Filme repetido
A última impressão depois da eliminação na Copa da Rússia é a que marcou Neymar. A ponto de, pela segunda vez, recorrer a um filme publicitário. Em 2011, desabafou contra o técnico René Simões em uma peça publicitária da Nextel. Na época, o técnico criticara o jogador afirmando: “Estamos criando um monstro”. A revolta de Renê era contra um ato de indisciplina de Neymar com o técnico Dorival Júnior no Santos.
No texto do filme de 2011, referia-se ao pai. “Você me xingou quando eu errei, gritou quando eu não escutei. Você me deu carinho, me deu amor e a noção de felicidade, e só ela é o que importa. Não é fama, não é dinheiro, não é carreira, não é poder. Você sabe quem eu sou: só mais um menino feliz brincando com a sua bola. E quero continuar assim para ser que nem você, pai”, dizia o garoto-propaganda.
Na tentativa de amenizar a imagem arruinada pelas simulações, as caretas de dor, as cores do cabelo, o péssimo desempenho na Copa e a ausência na lista dos 10 melhores do mundo, topou a proposta da Gillette, um dos patrocinadores mais fortes dele desde 2015, e fez outro gol contra. “Eu demorei a me olhar no espelho e me transformar em um novo homem. Mas hoje eu estou aqui, de cara limpa, de peito aberto. Eu caí. Mas só quem cai pode se levantar”, narra. “Você pode continuar jogando pedra. Ou pode jogar essas pedras fora e me ajudar a ficar de pé. Porque quando eu fico de pé, parça, o Brasil inteiro levanta comigo.”
Franceses chamam filme de surreal
Um levantamento do Ibope Repucom apontou que Neymar dobrou a rejeição a ele na internet na disputa da Copa do Mundo da Rússia. A pesquisa mostra que Neymar foi tema em mais de 25 milhões de postagens, entre Facebook, Twitter, Instagram e YouTube. Bem mais do que Messi e Cristiano Ronaldo. A maioria dos comentários, porém, teve teor negativo, abalando bastante a popularidade do profissional enquanto influenciador digital. O filme publicitário de domingo deve piorar a situação.
Antes da estreia do Brasil, Neymar recebia 28% de citações negativas em suas redes, o que aumentou para 61% após o empate com a Suíça e chegou a 68% depois da eliminação para a Bélgica. A cada 100 comentários posteriores à derrota por 2 x 1, um era positivo. Noventa por centro do total das críticas girava entre memes e piadas. O levantamento também fez um ranking dos países que mais depreciaram Neymar. O Brasil lidera.
A repercussão do filme publicitário de Neymar na França, onde ele defende o PSG, foi a pior possível. Surpresos com a franqueza do craque, que admitiu simular faltas “às vezes”, jornais e sites de internet constataram a repercussão negativa na opinião pública brasileira e mencionaram o “surrealismo” da mensagem.
A nova crise causada pelo filme publicitário levou até a mãe de Neymar às redes sociais para defender o filho. Dona Nadine Gonçalves escreveu: “Não se abata com as acusações”.
Veja a pesquisa do Ibope Repucom: